Publicada recentemente na Physical Review Letters, a pesquisa com o pomposo título “Matéria escura autointerativa resolve o problema final do parsec das fusões de buracos negros supermassivos” propõe a solução para uma questão não resolvida na astrofísica: em um sistema estelar exaurido, que força poderia impulsionar a fusão de dois buracos negros supermassivos (SMBHs) de um binário?
A nova metodologia para solução do problema envolve uma modelagem matemática inédita, que inclui pela primeira vez na equação a presença de partículas de matéria escura autointerativas que, segundo o estudo, ficam agrupadas ao redor dos buracos negros supermassivos, fornecendo o atrito necessário para que eles ultrapassem a distância final entre si.
Em um release, o primeiro autor do artigo, Gonzalo Alonso-Álvarez, da Universidade de Toronto no Canadá, diz que “mostramos que incluir o efeito anteriormente negligenciado da matéria escura pode ajudar os buracos negros supermassivos a superar esse parsec final de separação e coalescência“. Segundo o físico, o trabalho de sua equipe fornece uma explicação diferente do que se pensava até agora.
O problema final do parsec na evolução de buracos negros
Com base em inúmeras evidências observacionais e teóricas, a comunidade científica reconhece que os buracos negros supermassivos estão no centro da maioria das galáxias e, quando duas delas colidem, os seus respectivos monstros cósmicos entram em órbita um do outro. Essa aproximação dá início a uma perda de energia orbital, convertida em energia cinética das estrelas e gás que interagem com o binário.
A redução da separação orbital é fundamental para que os buracos negros supermassivos se fundam. Mas esse processo de colisão ainda não é bem entendido, pois, quando esses objetos espaciais atingem a distância de um parsec (o equivalente a cerca de 3,2 anos-luz), sua vizinhança galáctica “exaure”. Sem decaimentos orbitais, a órbita dos SMBHs se estabiliza. Mas, por quanto tempo?
Pelo menos há mais tempo do que o Universo existe, dizem os cientistas. O que nos leva ao problema final do parsec: como os buracos negros supermassivos conseguem se fundir e como fazem para superar a fase em que a perda de energia se torna ineficiente, assim que chegam à distância de 3,2 anos-luz?
Como a matéria escura ajudaria na fusão dos buracos negros?
Com estruturas densas de matéria escura no binário, os buracos negros supermassivos teriam apoio para se fundir.Fonte: Getty Images
A ideia de que os SMBHs nunca tenham se fundido foi descartada com a detecção de um zumbido de onda gravitacional de fundo, gigantescas ondulações no tecido do espaço-tempo provocadas pela mudança de velocidade de grandes massas. O que ainda não havia sido visto (porque não temos como vê-la) é a matéria escura. No entanto, os modelos anteriores a desconsideraram, pois suas partículas teriam sido também ejetadas para longe.
Como bons cientistas, Alonso-Álvarez e seus colegas decidiram testar isso por meio de modelos matemáticos. Nas simulações, eles descobriram que a chamada matéria escura, que interage consigo mesma (o que inclui a possibilidade de interações não gravitacionais), pode ser a peça que estava faltando ao quebra-cabeça.
Isso porque, entre essas interações adicionais, a matéria escura poderia experimentar colisões elásticas entre suas partículas. E apesar de isso não envolver forças eletromagnéticas, outro tipo de força hipotética poderia causar alterações de velocidade e trajetórias de suas partículas, redistribuindo a energia e momento e, finalmente, formar estruturas densas no binário, fornecendo “apoio” para os os buracos negros supermassivos se fundirem.
Ainda muito teóricas, as descobertas podem, indiretamente, fornecer uma nova ferramenta para compreender os mistérios da matéria escura. A partir da proposição de que “a evolução das órbitas dos buracos negros é muito sensível à microfísica da matéria escura”, explica Alonso-Álvarez, observações e fusões de SMBHs poderão ser um laboratório para entender essas partículas misteriosas.
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