Estamos sendo vítimas de propagandas enganosas. Querem nos convencer de que estaria tudo sob controle, quando não está. São usados os mais variados artifícios, procurando envolver a realidade com uma névoa espessa. O teatro do faz de conta provoca situações apenas ridículas, mas desastrosas para a sociedade. O resultado é uma fraude que se tenta encobrir sob o manto da politicagem e das ideologias obtusas.
Tornou-se imprescindível, por consequência, examinar atentamente esse cenário, sem respostas prontas para perguntas que nem chegaram a ser feitas. Vamos por partes:
“Saidinhas” temporárias
O feroz debate sobre o assunto provoca discussões tão acaloradas que a mera opinião que se sobreponha às reais interpretações. A respeito, nem sempre há honestidade intelectual. Óticas parciais provocam rupturas concentradas por opções partidárias, ou com acentuado caráter ideológico.
Mas o que interessa à sociedade? O bem comum, a satisfação para todos e não apenas para guetos. Entre esses itens, existem óbvias prioridades, entre elas a segurança pública, que oscila entre caótica, titubeante e derrotada.
A respeito, a observação dos constrangedores itens é unânime. Já o que fazer sobre sequências do fracasso, as impressões sobre medidas a serem tomadas são conflitantes e divergentes. Entre elas, as chamadas “saidinhas” dos estabelecimentos penais.
Em tese, elas contemplariam aqueles presos que, estando em situação diferenciada no cumprimento de suas penas, adquirem o direito de, quatro vezes por ano, podem sair da prisão por alguns dias e retornar depois.
A ideia, bonita, seria proporcionar a eles a oportunidade de reintegrar-se aos poucos para o convívio social. O resultado não é tão belo assim. Muitos não retornam. Pior: durante a ausência do cárcere, praticam crimes e são presos em flagrante.
Diz um lado interessado na questão: trata-se de uma minoria, e não se pode atingir a todos, genericamente, por causa de alguns. Diz a parte contrária: é um absurdo, ameaça para população, risco calculado e provado. Dizem os fatos: havia algo errado desde o começo, ao incluir nessas datas, por exemplo, o Dia dos Pais e das Mães, quando muitos dos beneficiados tinham a benesses, mesmo tendo trucidado os pais, como espantosamente acontecia. Essa parte, pelo menos, foi corrigida, embora tardiamente.
Mas existem outras, pois muitos preferem voltar a conviver com gangues do que ficar em âmbito familiar. Até porque grande parte dos prisioneiros está no ciclo da desagregação familiar e quando se fala em reeducar, é esquecido o detalhe de que muitos sequer foram educados.
Claro que existem alguns que, de fato, podem ser chamados de “reeducandos”. Grande parte, porém, prefere a reincidência, o que é facílimo de ser constatado.
No túnel do tempo, já se havia pensado nisso. Havia uma “Casa do Egresso” para cumprir exatamente esse papel: regularização ou expedição de documentos, cadastramento de empresas dispostas a investir na recuperação pelo trabalho, cursos profissionalizantes, orientação psicológica e serviço social para quem mais acentuadamente precisava. Acabou-se: hoje, o provisoriamente libertado, o reeducando, não tem como reeducar-se. É atirado no escuro e tentado pelos fascínios da liberdade perdida.
Na verdade, duas preliminares seriam indispensáveis de maneira eficaz:
1-) a classificação criminal, logo de entrada, para que os tipos diferentes de criminosos não ficarem misturados uns com os outros, provocando brutalidades decorrentes das regras próprias do sistema. Ou seja: não misturar quem apresenta periculosidade com quem não representa perigoso.
Desse modo, antes de permitir a saidinha, cada um seria devidamente examinado para constatar se teria direito a sair ou não. Atualmente, essa decisão é tomada apenas com cálculos aritméticos.
2-) organizar atividades para eliminar o ócio preocupante. Sem fazer nada, (laborterapia quer dizer recuperação pelo trabalho), as tentações ganham espaço dentro da mente vazia, que segundo os próprios presos, seria a “oficina do diabo”. Essa oficina é chamada pelos mesmos presos, de “faculdade”, porque se torna numa engrenagem praticamente incontrolável: facções criminosas recrutam novos integrantes.
O poder interno, outrora inútil, transformou-se num poderoso escritório (cartel, máfia, comando criminoso, organizações paralelas e clandestinas). Assim é que se criou o chavão: mandam dentro e fora dos presídios. O pior: isso é mesmo real.
O tema virou queda de braço: de um lado, a Câmara Federal, aprovando projeto que acaba com as saidinhas, atendendo aos mais variados clamores. De outro, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, manifestando-se abertamente contra. Ele é o guru presidencial para projetos serem sancionados ou vetados.
Estamos no momento decisivo para passar a questão a limpo, contemplando o bem comum, ou seja, as preferências e as preocupações da sociedade como um todo.
O Caso Mossoró
A cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte, referência na captação de sal marinho, tornou-se muito salgada com seu presídio tido como sendo de segurança máxima, de onde escapuliram dois prisioneiros membros de poderosa facção do crime.
Embora prova de fogo para o sistema, não é assunto para participação direta de um ministro de Estado. No caso, o da Justiça, pretendendo comandar “pessoalmente” as operações de captura. Ricardo Lewandowski desgastou-se com sua prioritária preocupação de mostrar serviço logo ao assumir o cargo.
Aliás, Justiça e Segurança não deveriam ser ministérios integrados, porque um nada tem a ver com o outro. Nunca funcionou, também, a tentativa de envolver em papel celofane as terríveis, desumanas e infames agruras do sistema penal.
Por sinal, o presídio potiguar, para ser ter uma ideia, nem muralhas tem. Projeto ridículo para uma prisão desse tipo, pois nem sabe o que deveria ser arquitetura prisional.
O caso, porém, embute uma sinistra realidade: são necessários os presídios de máxima segurança, exatamente porque existem presos de periculosidade máxima, que exatamente por isso são indesejáveis em seus estados de origem.
Veja só: para esse tipo, claro que não se pode nem pensar em saidinha. São perigosos por natureza, daí a existência desse tipo de presídio em Mossoró (RN), Catanduvas (PR), Papuda (DF), Presidente Wenceslau (SP), Rondônia (RO) e Campo Grande (MS).
O Caso Marielle
A vereadora Marielle Franco, assassinada no Rio de Janeiro, traz à tona uma situação grave, não apenas política, para reflexos na segurança pública. Ponto final no caso, porque a investigação, foi federalizada. Foram descobertos podres, não os de Shakespeare, contaminando de alto a baixo os alicerces políticos e policiais.
Para ser discutido: os estados possuem autonomia para gerir a área de segurança. No Rio, porém, se não fosse a federalização, o caso não poderia ser considerado resolvido. E nos outros estados, onde existem também casos muito graves sem solução? Foi aberto um precedente? Excepcional, natural ou extremamente necessário?
Rio, ainda: Marielle, finalmente. Graças a delação premiada. Palco de controvérsias pretensamente jurídicas. Recurso considerado maldito por vários advogados, que mudaram subitamente de posição quando contratados, a peso de ouro, para ficarem do outro lado do balcão.
Quando se trata de delação no mundo do crime, o autor é punido implacavelmente com a morte. Dizem que ele é dedo-duro, alcaguete, X-9, ganso e outros pejorativos. Seu único prêmio é a sentença capital.
No mundo dito civilizado, a ex-abominável delação pode ser premiada em determinadas circunstâncias. Já foi anulada, entretanto, judicialmente falando. Mas aprovada em outras. Afinal, serve para alguns e não para todos? Fins justificando meios, na perspectiva maquiavélica, o bem vitorioso acima do mal? Você decide.